Existem diferentes maneiras de se abordar uma cidade por meio da arte. Uma delas se dá através das iconografias paisagísticas – naturais ou urbanas – realizadas em diferentes épocas. Outra, nos fala sobre recordar os capítulos da história da arte local e, os tendo como filtros, traduzir algo singular sobre a cidade em questão. Há ainda um terceiro caminho, o que busca escrever uma espécie de crônica poética das distintas feições do tecido social daquele território estudado.
Na exposição Rio: a medida da terra, que marca a inauguração da Flexa, nos aproximamos do Rio de Janeiro, tendo como bússola os diferentes modos acima elencados. Reunindo quarenta e seis artistas que cobrem um arco temporal do início do século XIX até o presente, a coletiva apresenta paisagens históricas e atuais da cidade; trabalhos representativos do Neoconcretismo – um dos momentos mais relevantes da História da Arte carioca – em diálogo com os ecos em produções posteriores; por fim, vemos um conjunto de obras que se aproxima de questões políticas e sociais, como a violência urbana e a resistência cultural na forma da festa e do carnaval.
Um fio condutor de toda a mostra está na justaposição de trabalhos realizados em diferentes épocas, de modo a gerar uma fricção entre o passado e o presente. Tal gesto curatorial aponta para alguns caminhos – um deles reflete uma das vocações da Flexa, galeria cujo acervo compreende uma diversidade temporal ampla, possibilitando profícuos diálogos com a História da Arte. Já a abrangência do grupo de artistas, aqui mobilizado, faz jus a um Rio de Janeiro atravessado por uma série de aspectos que não convergem em uma imagem uniforme. Nesse sentido, são necessários múltiplos pontos de vista e contextos a fim de delinear uma mirada sobre a cidade, em sintonia com o caráter diverso e desigual inerente à sua formação.
Por fim, a escolha por uma montagem que não obedece a uma ordem cronológica, mas, antes, aproxima produções realizadas em datas distantes, nos faz recordar a forma com que Walter Benjamin (1892-1940) concebia a temporalidade das obras de arte. Para o filósofo, o trabalho de arte não contém em si uma temporalidade extensiva, mas sim intensiva. Sob a perspectiva benjaminiana, uma obra contemporânea é capaz de possuir vínculos mais próximos com outra, de cem anos atrás, do que, necessariamente, com alguma que lhe faça par na atualidade.
Luisa Duarte | Curadora
Lucas Alberto | Assistente curatorial
Notas
Ana Clara Tito
Sem título, 2023
argamassa, clarofilito, arame, vergalhão, rede plástica, transferência fotográfica
54 x 44 x 4 cm
(17885)
Carlos Vergara
Cacique de Ramos, da série Carnaval , 1972
impressão em metacrilato
60 x 180 cm
(17874)
Marcos Chaves
Sem título #02, da série Buracos, 1996/2008
fotografia
150 x 100 cm
3/3 + 2 P.A.
(17860)
Wanda Pimentel
Montanhas do Rio (Dois Irmãos, Gávea e Pedra Bonita) n°10, 1987
acrílica sobre tela
80 x 110 cm
(17825)
Rosana Paulino
A geometria à brasileira chega ao paraíso tropical, 2021
impressão digital, colagem e monotipia sobre papel
48 x 33 cm
(17660)