Por que visitar, hoje, os ecos do surrealismo? Por que nos aproximarmos, agora, de cosmologias alternativas ao marco ocidental, ou seja, de modos outros de organizar a realidade compartilhada? Diversos diagnósticos recentes nos recordam que vivemos uma época marcada pelo embotamento da imaginação, pela diluição da dimensão corpórea no trato com o mundo, pelo solapamento da esfera do sonho e pela resistência ao diálogo com as diferenças.
Diante deste contexto, dimensões como erotismo, delírio, sonho e alteridade, todas mobilizadas pelo legado surrealista e reimaginadas no interior daquilo que chamamos de “outras cosmologias”, ganham uma atualidade central. Com curadoria de Luisa Duarte, a segunda mostra coletiva da Flexa cobre um arco temporal cujo início remonta à década de 1920 e segue até o presente, de modo a reunir artistas com produções que se relacionam, de diferentes maneiras, com tais questões.
Ao contrário de uma compreensão difundida dos surrealistas, não lhes interessava tanto fabular um mundo fantástico paralelo ao nosso, sendo mais importante instaurar pontos de fratura na realidade corrente, que contribuíssem para estranhar a naturalidade de todas as coisas. Este movimento, cuja expressão dissemina-se da literatura para as artes visuais, propõe formas críticas de pensar e experimentar a realidade, motivo pelo qual suas propostas ainda nos fornecem subsídios para compreender o presente.
A mostra desloca certas narrativas históricas que consideram escassa a repercussão do movimento surrealista no Brasil, destacando como seus procedimentos poéticos continuam a ecoar na arte contemporânea do país. Ao mesmo tempo, coloca em cena algumas das diferenças entre o contexto histórico em que o surrealismo surgiu e o momento atual, observando as mutações sociais e culturais ocorridas desde então.
A exposição é dividida em quatro momentos. São eles:
Erotismo e morte, representado por artistas como Tunga, Waltercio Caldas, Ismael Nery, Maria Martins, Julia Gallo, Maria Lídia Magliani e Flávio de Carvalho.
Universo dos sonhos e a atividade onírica, na qual estão reunidos nomes como Cícero Dias, Marc Chagall e Rayana Rayo.
Zonas de delírio, que exibe trabalhos de Yayoi Kusama, Manuel Messias dos Santos e Darcílio Lima.
Alteridade e outras cosmogonias, onde são postas em diálogo obras de Chico da Silva, Maria Lira Marques, Claudia Andujar, Hélio Melo e Jaider Esbell, entre outros.
A primeira parte do título da exposição foi extraída do Primeiro Manifesto do Surrealismo, publicado há exatos 100 anos por André Breton (1896-1966). A imagem de uma noite capaz de abrigar o dia, contida no fragmento “a noite dos clarões”, sublinha a importância do trânsito entre a lógica do sonho e a lógica da vigília, como uma via para transmutar nossa relação com isso que se convencionou chamar de ‘realidade’. Neste bojo, propõe diálogos com os esforços recentes para suscitar a emergência de narrativas oriundas de cosmologias alternativas ao marco ocidental, dado presente no subtítulo da exposição.
Alex Červený
Alvim Corrêa
Athos Bulcão
Carybé
Chico da Silva
Cícero Dias
Claudia Andujar
Darcílio Lima
Diambe
Flávio de Carvalho
Glauco Rodrigues
Hélio Melo
Ismael Nery
Jaider Esbell
Julia Gallo
Manuel Messias
Maria Lídia Magliani
Maria Lira Marques
Maria Martins
Nilda Neves
Paloma Bosquê
Pedro França
Rayana Rayo
Rebecca Sharp
Rodrigo Braga
Tarsila do Amaral
Tunga
Victor Brecheret
Waltercio Caldas
Yayoi Kusama
Claudia Andujar
Floresta amazônica, Pará [Amazon Rainforest, Pará], da série [from the
series] Sonhos Yanomami [Yanomami Dreams], 1971/2015
impressão fotográfica sobre papel [photo prinKng on paper]
66 x 100 cm [26 x 39 3/8 in]
Paloma Bosquê
Fossil (Cisne) [Swan], 2024
fibra de algodão, gesso pedra, lã e Knta acrílica [coNon fiber, stone
plaster, wool and acrylic paint]
69 x 44 x 35 cm [27 1/8 x 17 3/8 x 13 3/4 in]
Rodrigo Braga
Ponto zero #11, 2019
impressão fine art sobre papel [fine art prinKng on paper]
80 x 120 cm [31 1/2 x 47 1/4 in]
Ed.: 5 + 2 P.A. [A.P.]
Victor Brecheret
Fauno, 1930’s
pedra francesa [French stone]
51 x 50 x 30 cm [20 1/8 x 19 3/4 x 11 3/4 in]
Athos Bulcão
A inundação de um sonho, 1952
pigmento mineral sobre papel [mineral pigment on paper]
27,3 x 24,3 cm [10 3/4 x 9 5/8 in]
Waltercio Caldas
Objeto parado [StaJonary object], 2017
aço inoxidável polido, resina e fio de algodão [polished stainless steel,
resin and coNon thread]
48 x 55 x 42 cm [18 7/8 x 21 5/8 x 16 1/2 in]
Carybé
Alexandrina e sua cidade, 1944
óleo sobre tela [oil on canvas]
110 x 80 cm [43 1/4 x 31 1/2 in]
Cicero Dias
Sem título [Untitled], 1928
óleo sobre tela [oil on canvas]
66,5 x 149 cm [26 1/8 x 58 5/8 in]
Francisco Domingos da Silva
Sem título [Untitled], 1972
guache sobre tela [gouache on canvas]
50,5 x 69 cm [19 7/8 x 27 1/8 in]
Hélio Melo
A transformação da seringueira I, 1989
nanquim e extrato de folhas sobre tecido [ink and leaves’ extract on fabric]
147 x 141 cm [57 7/8 x 55 1/2 in]
Hélio Melo
A vaca leiteira do seringueiro, 1981
nanquim e extrato de folhas sobre cartão [ink and leaves extract on paperboard]
18,5 x 25 cm [7 1/4 x 9 7/8 in]
Henrique Alvim Corrêa
Desejo sem limite, s.d. [n.d.]
nanquim, grafite, pastel e aquarela sobre papel [ink, graphite, chalk pastel and watercolor on paper]
30 x 22,5 cm [11 3/4 x 8 7/8 in]
Ismael Nery
Visão interna – Agonia, 1930’s
óleo sobre cartão sobre aglomerado de madeira [oil on paperboard on wood chipboard]
71 x 48 cm [28 x 18 7/8 in]
Jaider Esbell
O olho d’água e a guardiã, 2019
acrílica sobre tela [acrylic on canvas]
73 x 90 cm [28 3/4 x 35 3/8 in]
Yayoi Kusama
Infinity nets, 2014
acrílica sobre tela [acrylic on canvas]
97 x 130,3 cm [38 1/4 x 51 1/4 in]
Darcilio Lima
Sem título [Untitled], 1968
aquarela e nanquim sobre papel [watercolor and ink on paper]
20,5 x 15,3 cm [8 1/8 x 6 in]
Manuel Messias dos Santos
Cristo na Terra [Christ on Earth], 1968
xilogravura sobre papel [woodcut on paper]
90,5 x 48 cm [35 5/8 x 18 7/8 in]
Maria Lira Marques
Sem título [Untitled], 2021
pigmentos naturais sobre pedra [natural pigments on stone]
24,5 x 12 x 12 cm [9 5/8 x 4 3/4 x 4 3/4 in]
Pedro França
Sem título [Untitled], 2021
óleo sobre tela [oil on canvas]
106 x 120 cm [41 3/4 x 47 1/4 in]
Rayana Rayo
O 9 é melhor que o 10, 2024
óleo sobre tela [oil on canvas]
114 x 146 cm [44 7/8 x 57 1/2 in]
Glauco Rodrigues
O dia corta o escuro n° 4, da série [from the series] Adivinhações dos índios caxinauás, 1973
acrílica sobre tela colada em aglomerado [acrylic on canvas glued to chipboard]
55 x 46 cm [21 5/8 x 18 1/8 in]
Rebecca Sharp
Invention of Wheel Part II, 2024
óleo sobre tela [oil on canvas]
25,2 x 25,2 cm [9 7/8 x 9 7/8 in]
Tarsila do Amaral
Paisagem, 1929
grafite sobre papel [graphite on paper]
22 x 19 cm [8 5/8 x 7 1/2 in]
Tunga
Bell’s Fall, 1998
vidro fundido, esponja natural tingida, rede de poliamida, escova de cerda natural, feltro, madeira, bolas de sinuca, contas de cristal e bolas de cristal [glass paste, dyed natural sponge, polyamide net, natural bristle brush, felt, wood, billiard balls, crystal beads, crystal balls]
200 x 300 x 300 cm [78 3/4 x 118 1/8 x 118 1/8 in]